Tenho 39 anos. E ainda me lembro do meu
primeiro amor. Corria o longínquo ano de
1980. Tinha eu 5 anos. Andava na pré-primária. E tinha uma colega que parecia um anjo enviado para iluminar o mundo. Chamava-se Nancy. Sim sim, como a boneca. Parece mentira mas é verdade. Cabelos longos e louros. Tão
brilhantes que era como se o sol estivesse sempre a brilhar nela. Olhos
azuis cristalinos. Olhar-lhe nos olhos era mergulhar na lagoa azul. Cada vez que ela passava à minha frente, todo o som à minha volta era anulado. Só ouvia rouxinóis e canários numa manhã de sol. Tudo ficava em
câmara lenta. E aquele
perfume a Johnson & Johnson e a pó de talco que ficava a pairar no ar deixava-me em transe. Era um anjo a Nancy. Mas não me passava cartucho nenhum.
Um dia a turma foi toda num passeio escolar a um parque. Brincávamos todos no relvado imenso quando encontro
uma flor no meio da relva. Era um malmequer. A única flor no meio daquela relva toda. Apanhei-a. As meninas andavam a brincar às princesas ou lá o que é que elas brincavam, quando duas me viram com a flor na mão. A Nancy e a Tânia. Vieram a
correr ter comigo. A Nancy parecia uma das miúdas da
Casa na Pradaria a correr pelo campo em
slow motion. A mesma música e tudo. A Tânia parecia mais o Tom Sawyer. Chegaram ao pé de mim e as duas pediram-me a flor.
Aqui começa
o dilema. A Nancy, o anjo louro com olhos de diamante, o meu "
primeiro amor".
Pediu-me a flor. "É para eu pôr no cabelo" disse ela com uma voz que parecia acompanhada de harpas tocadas por outros anjos. A Tânia, uma menina comum, até a puxar um bocadinho para o feiinho, meio rapazola, também me pediu a flôr. "É para eu ser princesa" disse ela com voz de bagaço.
Meio perdido fico ali parado com a flor na mão a olhar ora para uma, ora para outra, sem saber muito bem o que fazer.
A Nancy, percebendo a minha hesitação, diz "eu dou-te um beijinho pela flor" enquanto rodava o seu lindo vestido branco folhado, joelinhos ligeiramente metidos para dentro. Sacanita. Perecbeu que eu embeiçava por ela e já estava a usar todo o seu charme para conseguir o que queria.
A Tânia, menina simplória e introvertida, pouco dada a essas coisas do charme e do encanto, mete a mão ao bolso das suas jardineiras cagadas, e tira um sapo em miniatura de brincar. Diz-me "eu dou-te o meu sapo pela flor".
Xiiiiiii.
Situação do caraças. Sabem o que eu fiz? Difícil esta decisão né? Pois é. Um puto com 5 anos já a passar por um dilema destes.
Caramba. Um dia conto-vos o que fiz.
Para já, e enquanto via o meu filho sentadinho com a Melissa que ele tinha acabado de conhecer sozinho, pensei para mim "aí está. a primeira paixão dele.
o que uma mulher é capaz de fazer. olha pra ele ali sossegado. nada o faz sentar assim sossegadito. só a Melissa. e o Toy Story 3."
Filho, só espero que sejas tão feliz como eu no
amor. Porque o primeiro amor é giro. Dá para escrever histórias em blogs e tal. Mas o maior amor ainda está para vir. Vai te fazer sorrir sem parar e vai te fazer doer como tudo. Mas vai
valer a pena. E quem sabe. Até pode vir a ser a Melissa. Porque
esta vida dá voltas do caraças.