01/03/2013

LEITE É LEITE


Esta semana pus-me a pensar sobre o quanto a ciência subestima o poder das pessoas. Vem isto a propósito de um post que li num blog de uma amiga, em que ela desabafava a angústia e desilusão de não conseguir amamentar o filho como esperava. É dar aí uma vista de olhos pelos livros e sites de especialidade e vemos o quanto impigem as pessoas com ideias pre-concebidas sobre o que deve ser feito e o que é melhor para ter um filho saudável e com fortes laços afectivos familiares. Parece que toda a gente sabe o que é melhor para os nossos filhos. Mesmo sem nos conhecerem. "Ai e tal o leite materno é fundamental. Ai e tal devem amamentar até o mais tarde possível. Ai e tal as aulas pré-parto e pós-parto. Ai e tal a alimentação. Ai e tal a música clássica na barriga". Arrisco-me a dizer que muitos destes especialistas não têm filhos. Ou então têm, mas passam tanto tempo no laboratório a estudar os filhos dos outros, que não acompanham os seus. Porque estas teorias que vendem livros a potes nas fnacs e na Amazon podem ser giras e tal, e até podem dar algumas dicas, mas estão longe de serem a verdade absoluta. Como a minha verdade também não é absoluta. Mas é a minha. Baseada no meu caso. Não digo que algumas daquelas coisas que os especialistas dizem não façam sentido. Mas eu tenho algumas perguntas para fazer.

Srs. Especialistas:
  • Uma senhora chamada Klara amamentou o seu filho, um menino chamado Adolf Hitler até aos 3 anos. Alguma ideia sobre isto?
  • O meu filho nasceu de urgência, prematuro às 32 semanas, depois de uma hemorragia intensa, fruto de uma placenta prévia total. Esteve internado semanas nos cuidados intensivos, entubado e alimentado a soro pelo umbigo. Dormiu sozinho numa incubadora ao som de máquinas e monitores, levou oxigénio artificial, luz artificial e quase não bebeu leite materno. Cresceu à base de suplemento (pasmem-se, artificial). Portanto desafiou todos os conceitos de um nascimento equilibrado, harmonioso e de termo. Comme il faut. Então Srs. Especialistas, como é que o meu filho não nasceu com um sinal na forma de 666 e com o mau feitio do miúdo do The Omen?
  • "Música clássica é a melhor para os bebés" dizem. E que se deve evitar música pesada, punk, rap e grunge. Ora, o tal menino que falei atrás, o Adolf, adorava Wagner. Já o meu filho cresceu a ouvir Fugazi, The Clash e Mötley Crüe. A única vez que ele ouviu música clássica, foi Vivaldi e as Quatro Estações, quando eu liguei para a PT e pus em alta voz enquanto me deixavam em espera.
  • "As aulas pré-parto e pós-parto são fundamentais" dizem. Aceito que são úteis e até podem ser divertidas, não sei. Nunca as desaconselharia. Mas fundamentais? Antes de serem um negócio lucrativo, como é que os pais e mães de antigamente faziam? E eu Srs. Especialistas, não tive oportunidade de fazer uma única aula, como é que eu consegui mudar fraldas, dar-lhe banho, dar-lhe sopa, preparar-lhe o leite, ajudá-lo nas cólicas, adormecê-lo, etc.
Srs. Especialistas que escrevem livros, eis algumas coisas que aprendi ao ser pai:
  • Não vale a pena obssecar com planos, agendas e calendários porque de repente tudo pode mudar.
  • Expectativas só devem ser isso mesmo. Expectativas. Nunca devem ser condições. Esperar que uma coisa seja de certa maneira é uma coisa. Ter de ser dessa maneira é outra.
  • Leite pode ser facilmente substituido. O que não pode ser substituido é o amor.
  • A benção com uma cegonha em origami resulta. Não me perguntem como.
  • Ser um bom pai e uma boa mãe não se aprende em livros nem com teorias. Há uma fórmula. Mas vem de dentro. E depois vai se aprendendo com tentativa e erro.
  • E talvez a mais importante lição que aprendi é que o importante não é estar preparado para o que vai acontecer. É estar preparado para o que não era suposto acontecer. Se alguma coisa podemos esperar é que o inesperado vai sempre acontecer. De uma forma ou de outra.
Ah, e leite é leite. Só isso. Exemplo: eu bebo leite de vaca há uma porrada de anos e não é por isso que tenho laços mais fortes com elas.

Boas paternidades e maternidades para todos.

6 comentários:

  1. Ao ler este post, resta-me dizer... Obrigada!

    ResponderEliminar
  2. Li este post e esbocei muitos sorrisos. Amamento o meu filhote. Nunca pensei gostar tanto de o fazer. Agora que está com quase 5 meses é delicioso vê-lo, enquanto mama, a olhar e a sorrir para mim. A mama não é para o meu texugo apenas alimento, mas tb conforto e amor. Se não tivesse à semelhança da mãe do Santiago hipóteses e amamentar? Sem dramas. Como disse e bem, só o amor é que não pode ser substituído. E nada no amor por um filho se deve reger por fundamentalismos e regras inflexíveis e obtusas.

    ResponderEliminar
  3. Adorei. E o que digo as minhas "amigas" quando pensam em ter um filho. Planos???? Depois conta como correu ;)
    Parabens adoro o blog

    ResponderEliminar